A FAMÍLIA

"É preciso fazer realmente todo o esforço possível, para que a família seja reconhecida como sociedade primordial e, em certo sentido, soberana. A sua soberania é indispensável para o bem da sociedade. Uma nação verdadeiramente soberana e espiritualmente forte é sempre composta por famílias fortes, cientes da sua vocação e da sua missão na história. A família está no centro de todos estes problemas e tarefas: relegá-la para um papel subalterno e secundário, excluindo-a da posição que lhe compete na sociedade, significa causar um grave dano ao autêntico crescimento do corpo social inteiro". (João Paulo II em “Carta às Famílias” / 2 de fevereiro de 1994)

01 setembro 2011

Semana da Pátria


“Independência ou Morte”
(ou “O Grito do Ipiranga”)
Pedro Américo, 1888
Acervo do Museu do Ipiranga, SP. (**)
 A pátria (...)  é o céu, o solo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o túmulo dos antepassados...

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Hoje, dia primeiro de setembro, tem início a Semana da Pátria.
Estou ciente de que as comemorações, de uns anos para cá, não são mais as mesmas que tanto nos tocavam e faziam despertar em nós o sentimento de brasilidade, o orgulho por nossos heróis pátrios, a emoção de vislumbrar a nossa Bandeira tremulando, a certeza de que éramos uma grande Nação.
Os tempos são outros. Os valores mudaram. Os heróis foram substituídos, os conceitos de Pátria, de Família, de sentimentos nobres, também foram “modernizados”. Até os que ainda sobrevivem têm conotações muito diversas daquelas que a nossa memória teima em não relegar ao esquecimento.
É por isto que eu decidi publicar hoje esta definição de Pátria, que nos foi legada por um dos brasileiros mais respeitados e ilustres de todos os tempos, Ruy Barbosa, “A Águia de Haia”, que tanto dignificou o Brasil. Merece de nossa parte profunda reflexão.
Vando

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A PÁTRIA
A pátria é a família amplificada.  
E a família, divinamente constituída, tem por elementos orgânicos a honra, a disciplina, a fidelidade, a benquerença, o sacrifício. É uma harmonia instintiva de vontades, uma desestudada permuta de abnegações, um tecido vivente de almas entrelaçadas. Multiplicai a célula, e tendes o organismo.  
Multiplicai a família, e tereis a pátria. Sempre o mesmo plasma, a mesma substância nervosa, a mesma circulação sanguínea.  Os homens não inventaram, antes adulteraram a fraternidade, de que o Cristo lhes dera a fórmula sublime, ensinando-os a se amarem uns aos outros:  Diliges proximum tuum sicut te ipsum.  
Dilatai a fraternidade cristã, e chegareis das afeições individuais às solidariedades coletivas, da família à nação, da nação à humanidade. Objetar-me-eis com a guerra?  Eu vos respondo com o arbitramento. O porvir é assas vasto, para comportar esta grande esperança. Ainda entre as nações, independentes, soberanas, o dever dos deveres está em respeitar nas outras os direitos da nossa.
Aplicai-o agora dentro das raias desta: é o mesmo resultado: benqueiramo-nos uns aos outros, como nos queremos a nós mesmos. Si o casal do nosso vizinho cresce, enrica e pompeia, não nos amofine a ventura, de que não compartimos. Bendigamos, antes, na rapidez da sua medrança, no lustre da sua opulência, o avultar da riqueza nacional, que se não pode compor da miséria de todos.
Por mais que os sucessos nos elevem, nos comícios, no fôro, no parlamento, na administração, aprendamos a considerar no poder um instrumento de defesa comum, a agradecer nas oposições as válvulas essenciais de segurança da ordem, a sentir no conflito dos antagonismos descobertos a melhor garantia da nossa moralidade.  
Não chamemos jamais de inimigos da pátria aos nossos contendores. Não averbemos jamais de traidores à pátria os nossos adversários mais irredutíveis.  
A pátria não é ninguém: são todos; e cada qual tem no seio dela o mesmo direito à idéia, à palavra, à associação.  
A pátria não é um sistema, nem uma seita, nem um monopólio, nem uma forma de govêrno: é o céu, o sólo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua e da liberdade. Os que a servem são os que não invejam, os que não inflamam, os que não conspiram, os que não sublevam, os que não desalentam, os que não emudecem, os que não se acobardam, mas resistem, mas ensinam, mas esforçam, mas pacificam, mas discutem, mas praticam a justiça, a admiração, o entusiasmo. Porque todos os sentimentos grandes são benignos e residem originariamente no amor.  No próprio patriotismo armado o mais difícil da vocação, e a sua dignidade, não está no matar, mas no morrer. A guerra, legitimamente, não pode ser o extermínio, nem a ambição: é, simplesmente, a defesa. Além dêsses limites, seria um flagelo bárbaro, que o patriotismo repudia.
Ruy Barbosa (*)
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Texto original  constante da  página 278 da ANTOLOGIA BRASILEIRA – Coletânea em Prosa e Verso de Escritores Nacionais”, Eugenio Werneck, Livraria Francisco Alves, RJ, 22ª edição, 1942. A trascrição obedece rigorosamente a gramática da época.  
Transcrito do site INTERNET ARCHIVE 
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Referências Biográficas

 (*) Ruy Barbosa de Oliveira nasceu em Salvador, na Bahia, no dia 5 de novembro de 1849 e faleceu em Petrópolis, RJ, em 1º de março de 1923. Jurista, diplomata, escritor, tradutor, filólogo e um dos maiores oradores brasileiros, foi um dos mais brilhantes intelectuais de sua época.
(**) Pedro Américo de Figueiredo e Melo, além de pintor, também foi romancista e poeta. Nasceu no município de Areia, Estado da Paraíba em 29 de abril de 1843 e faleceu em Florença, Itália, no dia 7 de outubro de 1905.
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